Consequências da privatização

Os defensores da privatização da educação no Brasil, via terceirização de gestão para organizações sociais, difundem a ideia de que terceirizar não é privatizar. Para eles, privatizar é vender um bem público. Não reconhecem outra forma de privatização, pois não lhes convém. Como este movimento está no começo, ele precisa ser viabilizado e uma das maneiras de se fazer isso é amenizar o discurso da privatização. Mais que isso, uma “nova teoria” sobre o que é privatizar foi elaborada jogando com termos como “desestatizar não é privatizar”, pois o patrimônio público é preservado e o serviço é prestado por uma terceirizada mas “sob controle do estado”. Até o PT caiu neste conto.
Em Goiás, onde estas novas teorias estão florescendo, argumenta-se ainda que haverá uma “separação entre a gestão e o pedagógico” de forma que a terceirizada somente cuidará da gestão e a secretaria através dos diretores, que continuarão os mesmos, cuidará do pedagógico. Mas este é só um primeiro passo em direção à terceirização plena. O que move a terceirização em suas várias formas é a diminuição do estado.
Não podendo também objetar os problemas que acompanham os processos de privatização em outros países, divulgam que o caso brasileiro “é diferente”, “inédito”. Com isso, pretendem sugerir que não se produzirão no Brasil os problemas que acontecem em outros países. No entanto, este “experimentalismo” não tem outro objetivo a não ser “adoçar a pílula da privatização” e estabelecer a ideia.
A outra argumentação corrente é que as organizações sociais que estarão assumindo as escolas no Brasil, são OSs sem fins lucrativos. Isso igualmente não se sustenta, pois como é sabido, nos países em que se privatizou por terceirização constituiu-se um mercado tanto de organizações sociais sem fins lucrativos, como com fins lucrativos. O que ocorre é que a ordem de seu aparecimento se dará em série: primeiro aparecerão as sem fins lucrativos, para constituir o mercado; e em seguida proliferarão as com fins lucrativos. É da lógica do mercado.
A privatização no Brasil não causará problemas somente na área da educação. Ela também está instalando-se em outras áreas como a saúde e em breve atingirá a segurança pública.
Na educação, induzirá o aumento de alunos em sala de aula (quanto mais alunos por sala, menor o gasto da OS); induzirá a eliminação de alunos que custem mais para aprender, como os mais pobres e com necessidades especiais (a menos que tenham custo diferenciado como ocorreu no Chile); fraudes com número de alunos atendidos, inflando este número e ocultando a evasão, entre outros eventos. Mas o pior: não haverá melhoria substancial na qualidade da educação brasileira. Até Gustavo Ioschpe, por outros motivos, concorda com isso: “não acredito que a privatização do sistema educacional teria impactos significativos sobre a qualidade do ensino” – diz ele.
O movimento pela privatização não é nada mais do que um assalto combinado aos cofres públicos com a finalidade de criar uma linha direta de transferência dos recursos da educação pública para a iniciativa privada.
Para ajudar a firmar o mercado das Organizações Sociais não tardará a se aprovar alguma lei no Congresso que permita descontos volumosos no imposto de renda de empresas que, através de suas fundações, façam doações a Organizações Sociais educacionais com ou sem fins lucrativos. A Wallmart reservou este ano, nos Estados Unidos, um bilhão de dólares de sua fundação (Walton) para incentivar as escolas charters. E eles fazem isso há mais de 15 anos sem que a educação americana tivesse melhorado. Além do “custo aluno” pago pelo estado, elas ainda receberão doações polpudas.
Toda esta ação predatória sobre o estado vai desestruturar sua política social com consequências dramáticas para a própria sociedade e para a democracia.
Sobre estas questões Ravitch alerta em seu blog:
“Não se engane: o propósito da privatização é fazer lucro. A promessa da privatização é a eficiência. Mas na sua busca por lucro e eficiência, a privatização cria incentivos perversos. Ela incentiva a gestão privada de escolas charter a evitar ou se livrar de estudantes “caros” (a menos que a fórmula de reembolso torne rentável mantê-los), incentiva hospitais com fins lucrativos a diagnosticar pacientes e realizar cirurgias desnecessárias, incentiva os prestadores privados de educação especial pré-escolares a diagnosticar erradamente crianças como se necessitassem de serviços especiais para aumentar seus lucros. E incentiva gestores privados de prisões a manter a população carcerária tão grande quanto possível, uma vez que uma cela vazia é uma cela que não produz receita.”
Os defensores da privatização no Brasil, em seus rompantes de sabedoria, acreditam que vão criar uma sistema de “regulação” mais eficiente do que o americano. Enganam-se, ninguém controla o mercado e o estado é cada vez mais cerceado nesta tarefa.
Luiz Carlos de Freitas                                                 Publicado em  www.avaliacaoeducacional.com  

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